
Adolescentes participantes do Protejo, programa do Ministério da Justiça, aprendem no picadeiro que a vida pode ser bem diferente da realidade das cidades onde vivem, consideradas as mais violentas do DF.
Robson Gomes de Oliveira é um rapaz esguio e habilidoso. Tem 20 anos. A maior parte deles vividos na Estrutural. Tem 13 irmãos. No começo, quando não conhece com quem conversa, fala baixo e pouco. Depois de verificar o caráter do outro, conta com desembaraço os problemas que já teve ou que ele mesmo criou. Não demonstra autopiedade tampouco vanglória. Passa a impressão de que sabe o que é certo e errado e que, há pouco tempo, finalmente pôs os pés no chão. Robson esteve em maus lençois no passado. Usou drogas, abandonou a escola, farreou muito e nunca pensou que o futuro lhe reservasse grande coisa. Até o dia em que um carro de som passou por ele anunciando a abertura das inscrições, na Estrutural, para o Projeto de Proteção de Jovens em Território Vulnerável (Protejo), do Ministério da Justiça, executado pela ONG Saber. Uma descrição acurada da situação dele. Resolveu tentar a sorte e se cadastrou.
“Pensei que eu não ia conseguir. Muita gente queria”, admite. Contrariando o prognóstico, seu nome constava da lista de aprovados. A proposta do Protejo é tirar os jovens da trilha da violência usando a educação, a cultura e o esporte. O programa está presente na Estrutural, no Itapoã e em Arapoanga — consideradas as cidades mais violentas do Distrito Federal — e tem oficinas dos mais variados temas, além de aulas de informática. “Quando entrei, tinha gente que morria de medo de mim”, revela. Fez algumas oficinas, mas se encantou pelas aulas de hip-hop. O Protejo auxilia os alunos com uma bolsa de R$ 100 por mês.
Foi curto o tempo que ele levou para mudar de atitude: “Eu estava perdido antes de entrar no curso. Depois, comecei a me afastar de pessoas que faziam coisas erradas, que não queriam nada com a vida”. A escolha foi sábia. Mais de um ano depois, seu desempenho foi tão satisfatório que Robson foi convidado a participar de uma oficina e se apresentar na Universidade Livre do Circo, a Unicirco, criada pelo ator e notório circense Marcos Frota e atualmente montada ao lado da Biblioteca Nacional. “As pessoas com quem eu andava naquela época morreram ou estão presas”, diz. Robson se salvou. Na quarta-feira, jogou capoeira pela primeira vez na Unicirco para uma plateia de 2.500 pessoas. “Tem sido uma experiência maravilhosa. Posso aprender cada vez mais.”
O Robson de antes são águas passadas. O circo vai embora na segunda-feira e, se ele pudesse, iria junto. Mas vai ficar e, pela primeira vez, ele tem planos para o futuro. Quer voltar a estudar — só chegou até a 8ª série — e ter uma profissão. “Quero fazer o curso de vigilante. Quero fazer tudo certo daqui pra frente.” Se um dia ele foi considerado má companhia, hoje ele tem convicção de que é um exemplo de superação.
Sui generis
O picadeiro no qual Robson executa piruetas e mortais é o mesmo em que Helber Rocha de Oliveira ginga bolas ou claves em malabarismos. “Eu sou essa peça rara aqui”, se autodenomina o jovem de 18 anos. Faceiro e sorridente, ele faz as manobras com os três elementos parecer muito fácil. Talvez porque para ele tenha sido. Dominou os malabares em uma semana. Gostou tanto que levou o equipamento para treinar em casa, em Arapoanga, um dos bairros de mais alta criminalidade em Planaltina.
Helber, assim como os 1.783 adolescentes atendidos pelo Protejo entre janeiro de 2009 e fevereiro deste ano, conhece de perto a violência. Aprendeu com as oficinas e com a Unicirco que as escolhas certas podem levá-lo a um lugar melhor. “O Protejo me ensinou a persistir, a ir até o fim. A acreditar que as coisas podem ser diferentes. Meu pensamento mudou, minhas amizades mudaram”, afirma. Helber voltou a estudar, quer terminar o 2º grau. Hoje, ele pode fazer malabarismos, mas agora sabe que não precisa passar o resto da vida se equilibrando em uma corda bamba. Quer crescer e jura que vai investir em um sonho antigo: ser professor de Educação Física.
Filho de Marcos Frota e diretor artístico do circo, Apoena Frota acredita no potencial transformador da arte. “A Unicirco tem um mote: um projeto artístico com atitude social. A gente tem a pedagogia da convivência, você está o tempo todo aprendendo. Por onde a Unicirco passa, a gente propõe essa filosofia. O Protejo e a Unicirco têm uma afinação de alma”, analisa. Segundo o coordenador artístico e pedagógico dos espetáculos, Richard Moreno, muitos jovens do Protejo chegam ao circo sem acreditar que vão conseguir fazer o que os profissionais fazem, mas, com o incentivo certo, chegam lá. “Ver esses meninos fazendo malabares com apenas duas semanas de prática, isso prova um ponto para nós e para eles. Mostra que eles são capazes”, diz.
Ariadne Sakkis
Correiobraziliense.com.br
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