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terça-feira, 10 de agosto de 2010

Cadê a pipa que estava aqui?


Filhos crescem e viram pais, que, por sua vez, amadurecem e viram avôs. É o ciclo da vida, uma das poucas coisas imutáveis de um universo em constante atualização. De uma ponta a outra da história, lá se vão quatro, cinco, seis décadas de memórias. O menino que antes brincava de pião no quintal de casa hoje assiste à nova geração passar ilesa por uma noitada cibernética, assistindo a animações futurísticas na internet e batendo papo em tempo real com colegas do outro lado do planeta. Pouco se veem meninos travessos correndo pelas ruas e enroscando suas pipas em árvores. A coleção de carrinhos de madeira deu lugar aos videogames de última geração. Para que sair de casa para brincar quando se pode fazer gols de craque do sofá da sala? Ficou perigoso lá fora, ficou solitário também. Todas as molecagens do mundo agora cabem no quarto.

Os filhos já não são mais os mesmos. Contra isso, não há argumento. Mas, e os pais? Acompanharam a revolução que veio a reboque da tecnologia e da saída da mãe para o mercado e trabalho? Os novos tempos impõem novos desafios para a educação. Se, antes, malcriação se resolvia à base da palmada e se o papel do pai era, principalmente, o de reprimir, hoje é preciso jogo de cintura, dizem os especialistas. “Se o pai de hoje aprendeu apanhando do pai de ontem, não quer dizer que seus filhos precisem disso. É como se ele dissesse: ‘eu, quando era criança, andei de bonde e, por isso, você vai ter que andar também’. Não faz mais sentido”, sentencia o psiquiatra especialista em educação Içami Tiba, autor de livros como Família de alta performance e Seja feliz, meu filho. “Muitos pais não acompanharam as mudanças e, aí, a história do ‘me respeita que eu sou seu pai’ não resolve porque ele não soube impor o respeito da maneira certa, na base da conversa e da educação”, complementa.

Mas também é certo que os pais estão mais afetivos. “Eles participam mais da vida dos filhos, querem saber mais da sua intimidade, da rotina. Essa aproximação é saudável e é desejada. O que não pode é ser aquele pai que deixa tudo, porque esse acaba não se comprometendo”, analisa o psicanalista Rubens de Aguiar Maciel, especialista em paternidade do Hospital das Clínicas de São Paulo. O maior desafio parece ser descobrir o complicado meio-termo entre participar, ser amigo e impor limites e respeito. Aqui, a Revista mostra cinco exemplos, de diferentes gerações, que deram certo.

Quando o corretor de vendas Weber Rios, 39 anos, começa a contar da infância no Cruzeiro, a história que se ouve é semelhante a de todos os que foram moleques na mesma época. O parque de diversões era a rua de casa, um imenso convite para a imaginação correr solta. Na rua, ele soltava pipa, brincava de bolinha de gude, de pneu e fazia o melhor carrinho de rolimã entre a molecada, tanto que até vendia o brinquedo para os amigos. Passadas três décadas, Weber ainda brinca. A diversão, agora compartilhada com o filho, o pequeno Cauan, 6, tem mais a ver com manobras radicais sobre um skate, gols dignos de craque no futebol e ultrapassagens arriscadas numa corrida de carros para lá de possantes. Mas, calma lá. Weber não faz o tipo maluco de pai. As aventuras das quais participa com o filho ocorrem por trás de uma tela de TV. Tudo virtual – e muito seguro, a princípio. E adivinha quem leva a melhor? “Eu!”, responde, ligeiro, Cauan. “Mentiroso!”, emenda o pai. “No futebol, ele ganha, mas na corrida de carros, eu ganho”, defende-se.

Cauan já nasceu na era do videogame. Tinha só quatro anos quando ganhou o seu brinquedo de controle remoto e, desde então, não tem para ninguém na caixa de brinquedos. Enjoou dos carrinhos, dos jogos de montar e dos bonecos de super-heróis. “Já tive bolinha de gude, mas nem sei mais cadê”, confessa o garoto. Com a pipa, ele também não demonstra lá muita intimidade.
Enquanto o pai preparava uma rabiola para a pipa, o menino só olhava, sem muita curiosidade. “Já soltei pipa uma vez, mas faz tempo, nem lembro mais!”, conta.

Para Weber, o jeito foi mesmo se adaptar. Guardar na lembrança o Popeye, o marinheiro atrapalhado que se transforma em super-herói com uma lata de espinafre, e se distrair com o ogro Shrek e com os atrapalhados Pinguins de Madagascar, desenho animado produzido com tecnologia de alta performance. “Gosto desses desenhos novos também. Me divirto com ele”, confessa o pai.

Além das brincadeiras, muita coisa mudou nesses 30 anos que separam as infâncias de pai e filho. A revolução mais importante, na verdade, independe de época e de tecnologia: Weber cresceu e trocou o papel de filho traquina pelo de pai responsável. A habilidade de fazer o próprio carrinho de rolimã deu lugar a uma performance que inclui trocar fraldas, ajudar em casa e fazer aviõezinhos boca adentro. Sinal dos tempos que exigem um paizão por perto, do tipo que dá o primeiro banho. Coube a ele largar o emprego, já que a mãe tinha uma jornada intensa, e hoje trabalhar num esquema que o permita ficar o máximo possível com o filho. “Nunca tive uma relação muito afetiva com meu pai. Ele trabalhava muito, a gente se via pouco e conversava menos ainda. Vou ser amigo do meu filho, com certeza”, justifica Weber. “Mas quero passar para o meu filho a religião, que aprendi a seguir com meus pais”, pondera.

Sentado no sofá da sala e rodeado pelos quatro filhos, Esdras, 29 anos, Luciana, 26, e as gêmeas Larissa e Anelisa, 22, o professor de matemática Nilton Silva, 61, é o retrato de um pai que tem consciência de que fez o melhor pelas crias. Nessa família, comparar a juventude das duas gerações é tarefa quase impossível. “Eu não tive infância nem adolescência. Comecei a trabalhar na roça aos 12 anos. Para eles, fiz de tudo para que tivessem o que eu não tive”, resume Nilton. Nascido e criado em Carmo do Paranaíba, no interior de Minas Gerais, Nilton é o segundo de oito irmãos. Com tanta boca para alimentar, brincar nunca foi exatamente uma prioridade em casa. “Não tinha tempo”, diz. Aliás, nem para brincar, nem para estudar. Quando começou o ginasial (atualmente 5ª a 8ª série do ensino fundamental), Nilton já tinha 18 anos.

Os poucos brinquedos que tinha em casa foram feitos por ele e pelos irmãos. Aprendeu com o pai, marceneiro, a fazer caminhõezinhos de madeira. A criação foi rígida. “Ele era muito autoritário. Acho que porque meu avô era assim e ele quis dar para a gente a criação que teve”, supõe. Para os filhos, Nilton relaxou, mas não faltou limite. O mais velho, Esdras, é o único homem. “Fiquei melhor que ele com a bola!”, provoca o primogênito, que nasceu exatamente num Dia dos Pais. “Quando ele nasceu, eu já pensava numa criação diferente, mas sempre soube exigir, estabelecer regras e limites”, avalia.

Além do time do coração – todo mundo por ali aprendeu a torcer pelo Corinthians – Esdras diz que herdou do pai o jeito de brigar. “Minha mulher fala que eu grito como ele”. Verdade? “Se ela está falando, é porque deve ser!”, responde o pai. A admiração pelo pai levou Esdras, hoje formado em administração, a prestar vestibular para engenharia, só para satisfazer um desejo antigo do pai. “Eu queria ser engenheiro civil e não consegui. Fui fazer matemática porque era um pouco parecido nas exatas. E aí ele prestou engenharia para me agradar. Mas eu disse para ele fazer o que quisesse. Se nem eu fui engenheiro…”, conta Nilton. Esdras não discorda do pai. Afinal, pai tem sempre razão.

Três anos depois de que Esdras nasceu, chegou Luciana. Um casal já parecia ótimo. “Criar menina é muito diferente e a Luciana não era tranquila que nem o Esdras, puxou a minha teimosia”, pondera o pai, diante da filha, envergonhada. As brincadeiras de boneca ficavam mais para a mãe, porque ela “entendia melhor dessas coisas”. As caçulas, as gêmeas Larissa e Anelisa, foram um susto. “A gente queria um terceiro filho, mas só descobrimos que eram gêmeas na hora do parto”, conta Nilton, que chegou a sonhar, na noite anterior ao parto, que a mulher daria à luz duas meninas. “Contei o sonho pra ela. Quando a enfermeira pediu para eu ir conhecer as minhas filhas, fiquei assustado. Falei ‘como assim filhas?’”, recorda-se.

Esdras é servidor público, Luciana é farmacêutica e as gêmeas, que seguiram a irmã mais velha na escolha da profissão, também estão para pegar o diploma. Não tiveram que dividir o quarto com tantos irmãos como pai, nem parar os estudos para ir trabalhar na roça. Muito menos tremeram de medo diante de um pai que educava com mão de ferro. Nilton é conselheiro de todos eles. Do dinheiro para o cinema à opinião sobre uma decisão importante, tudo passa por ele. “A paternidade foi uma bênção de Deus. Não foi difícil educá-los. Acho que consegui dar aos meus filhos um bom direcionamento. A sensação é de dever cumprido”, conclui, enquanto os filhos seguram as lágrimas.

Carolina Samorano
Correiobraziliense.com.br

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