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segunda-feira, 24 de maio de 2010

Da Amazônia para o mundo

Muito legal ver a tecnologia nacional crescendo e auxiliando a exploração cada vez mais sustentável dos recursos da Amazônia.

Técnica de fabricação de borracha criada na UnB beneficia famílias de seringueiros no Norte. O produto, elaborado de forma sustentável, ganha mercado e já é vendido para empresa de calçados europeia.

Há 15 anos, uma tecnologia desenvolvida por pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB) desembarcava no extremo oeste do Brasil, no Acre. O objetivo era comprovar os resultados obtidos em laboratório e produzir uma borracha de alta qualidade e de maneira simples, dispensando processos intermediários, como o beneficiamento em usinas. Ao mesmo tempo, a experiência significaria um trabalho que gerasse renda e condições dignas para os seringueiros. O projeto Tecbor — Tecnologia para Produção de Borracha e Artefatos na Amazônia — deu tão certo que, hoje, vê seus frutos nas solas de sapatos europeus.

Idealizado pelo Laboratório de Tecnologia Química, do Instituto de Química (Lateq/IQ) da Universidade de Brasília, o Tecbor conseguiu romper a academia e chegar à sociedade por sua implementação simples e voltada diretamente para as comunidades que moram na região. “Com a produção da borracha, as populações que vivem na floresta passam a ter renda e condições de se manter sem a necessidade de derrubar as árvores para vender a madeira. Ou seja, com a floresta em pé e bem manejada, é possível, além de preservá-la, ter uma fonte de renda inesgotável”, afirma o químico e coordenador da iniciativa, Floriano Pastore, que trabalha em conjunto com o químico Marcelo Soares e a pesquisadora extensionista Vanda Ferreira.

A tecnologia compõe um sistema produtivo simplificado, robusto e flexível que funciona de acordo com as necessidades da comunidade. “O seringueiro precisava ter uma produção diferenciada para ter competitividade”, justifica Pastore. A folha de defumação líquida (FDL) — derivada da coagulação do látex no processo Tecbor — agregou valor à borracha por não conter impurezas e sair da floresta pronta para ser processada nas indústrias.

Os estudos da UnB demonstraram que a borracha resultante da técnica (veja arte) é mais flexível e mais resistente que a sintética ou a obtida com a defumação tradicional. “As melhores borrachas do mundo estão na Amazônia. Por serem nativas, as árvores produzem látex com moléculas maiores que as oriundas de seringais de cultivo, o que dá as características de maior resistência e flexibilidade”, explica o coordenador do projeto.

Uma das principais vantagens do projeto é que o próprio seringueiro produz a borracha e não utiliza insumos prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente. “No processo de produção convencional, é usado ácido acético para coagular o látex, proveniente das carvoarias. Ele pode causar cegueira, por conta de sua fumaça”, explica Pastore. O Tecbor também não utiliza luz elétrica, já que a secagem da FDL é feita ao ar livre.

Outro fator importante é que o projeto se preocupou em inserir também as mulheres no processo produtivo, além de unir seringueiros em associações que comercializam as FDLs. Segundo Pastore, as mulheres ficavam ociosas, enquanto os homens se embrenhavam na mata para coletar o látex — a coleta é de três dias para cada árvore. Com o Tecbor, essas mulheres se ocupam no processo de calandragem e secagem.

Mais de 400 famílias já foram treinadas em vários municípios do Acre, da Amazônia, do Pará e de Rondônia. Mas foi no Acre que o projeto conseguiu os melhores resultados, com a implementação da tecnologia sendo adotada como política pública pelo governo estadual. Lá, 260 famílias de seis municípios são beneficiadas e os planos são de elevar esse número para mil.

Exportação
A borracha produzida pelos seringueiros atrai empresas que buscam qualidade ligada à sustentabilidade. É o caso de uma fabricante de tênis francesa que utiliza couro vegetal feito na Paraíba e a borracha produzida no Acre na produção de seus calçados. “O consumidor está cada vez mais consciente, se interessa por esse diferencial socioambiental. A produção de FDL é uma forma de agregar valor à borracha no seringal”, diz Bia Saldanha, agente de compras da empresa.

A aplicação da FDL já está consolidada no mercado. Porém, a ideia é ampliar sua comercialização e qualidade. A folha de borracha produzida na Amazônia é similar a um produto feito na Índia, Tailândia e Malásia, a RSS (Ribbed Smoked Sheet), utilizada em pneus de carros da Fórmula 1 e dos ônibus espaciais. “A nossa borracha tem tudo para chegar a esse padrão”, afirma Bia.

Para isso, são necessárias mais pesquisas que evitem problemas como a ocorrência ocasional de fungos. “Nossos esforços estão voltados para o desenvolvimento de fungicidas. Queremos dar mais qualidade ao produto, que tem competitividade e diferencial, além de melhorar ainda mais a vida dos seringueiros, nossos guardiões da floresta”, conclui Floriano Pastore.

Correiobraziliense.com.br
Silvia Pacheco
Publicação: 24/05/2010 08:49

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